sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

"A nossa tripulação sofreu uma baixa"

António Grifo (também na foto em destaque) na companhia de ex-fragatas na "Assada de peixe" realizada em Lagos no dia 27 de Agosto de 2011.
António Grifo (ao centro) com 12 anos de idade, na companhia do "Alcantarilha" e do "Alfaçe".

O nosso adeus ao companheiro “Grifo”
Há coisas que não estão na nossa vontade em determinar a nossa presença entre aqueles que mais queremos, ou perpetuar a amizade que nutrimos para com os nossos amigos que caminharam por trajectos sinuosos de uma vida um pouco conturbada. A vida por vezes prega-nos inesperadamente uma partida para a qual não estamos preparados, ao ponto de nos roubar os momentos de felicidade que pensávamos viver eternamente, embora também não tivéssemos, tendo em conta as circunstâncias da vida, os cuidados em a preservar.
O nosso companheiro “Grifo”, de figura um pouco franzina mas aparentando gozar de uma felicidade transbordante, foi mais um de entre tantos os que não conseguiram transpor “aquela curva da vida”, que decide aquilo que dizem ser o nosso destino.
A vida do nosso companheiro “Grifo” foi sempre desde muito cedo muito atribulada, a partir do momento que, com apenas 13 anos de idade conseguiu transpor uma vigia e esconder-se dentro do batelão que abastecia a Fragata D. Fernando II e Glória de água e fugir daquela velha Nau, por temer represálias de um dos sargentos por lhe ter atirado à cabeça uma barra de ferro.
Desde esse dia, ninguém mais soube do paradeiro do “Grifo” dado que nunca mais regressou à instituição, sabendo-se mais tarde que foi parar a Moçambique onde se empregou nos Caminhos de Ferro de Moçambique, inicialmente como fogueiro e mais tarde como maquinista, não deixando no entanto de em ambas as profissões e durante alguns anos, de encardir os seus pulmões com a fumarada negra e espessa do carvão queimado que servia de força motriz àquelas antiquíssimas locomotivas.
Depois de alguns anos em África e de regresso a Portugal, empregou-se numa pedreira, empresa de corte e tratamento de mármores (onde trabalhava sem qualquer equipamento de protecção) o que também não era nada saudável e em nada veio a contribuir para restabelecer e regenerar o seu sistema respiratório, de onde mais tarde veio a sofrer as suas consequências.
Isto tudo para vos dizer que o nosso companheiro António Marques Santos Grifo (“Grifo”) de 66 anos de idade, nascido em 8 de Fevereiro de 1945, ex-aluno da Fragata D. Fernando II e Glória com o número 244, tendo entrado em 1955 e saído em 1959, natural de Mexilhoeira Grande, Lagos (Portimão), ex-combatente na Guerra Colonial, faleceu no passado dia 29 de Dezembro de 2011, vítima de repentina doença pulmonar.
A última vez que estive com ele foi no verão deste ano, tendo sido ele o organizador da “Assada de Peixe” no dia 27 de Agosto em Lagos, que serviu de pretexto para que os ex-fragatas residentes na zona do Algarve se encontrassem em breves momentos de convívio, onde também o saudoso “Grifo” teve a amabilidade de oferecer à minha filha Mafalda uma colecção de búzios do mar, que a mesma disse, ao saber do seu falecimento, ir continuar a preservar como prova da sua singela gratidão.
Para quem não teve conhecimento, o funeral do nosso companheiro “Grifo” realizou-se na passada Sexta-feira, dia 30 de Dezembro pelas 17,30 horas, tendo o seu corpo sido transportado para o cemitério de Lagos.
A todos os seus familiares e amigos e em nome de todos os ex-alunos da Fragata D. Fernando II e Glória, “Cesto da Gávea” envia os seus sentidos pesamos, e esteja ele onde estiver aqui fica o nosso abraço solidário.
Carlos Vardasca
(Braz, ex-aluno nº 14. 1963-1968) 
30 de Dezembro de 2011 

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Uma noite na aldeia (conto)


Já se previa um inverno rigoroso. O manto de neve que cobria todo o distrito de Chaves há muito que também branqueava os campos em redor da aldeia de Moure, o que era sempre motivo de preocupação para os seus habitantes.
Os pastos rareavam. As cabras que era hábito a Gracinda[1] levar para o pastoreio já raramente saíam do estábulo, e o telhado coberto de neve já não fumegava pelos intervalos das placas de ardósia mas apenas pela velha chaminé, onde o odor daquela sopa gordurosa juntava à mesma mesa a frágil adolescência de Gracinda e os restos de saudade que consumiam a mãe, que ainda chorava a ausência do marido em parte incerta, e a angústia de quem mal tinha forma nem como gerir os parcos dinheiros que moldavam a sua pobreza.
Bastante agasalhada, acabada de chegar do forno comunitário da aldeia onde fora buscar o pão amassado pela Ana dos Currais, fascinada por tanta iluminação e depois de transpor o arvoredo que circundava a casa de quem, sendo médico em Lisboa apenas ali vinha ficar em épocas festivas, Gracinda abeirou-se de uma das janelas e ali ficou estupefacta, contemplando maravilhada a enorme árvore de natal e um amontoado de papéis de embrulho já rasgados que se espalhavam por toda a sala, depois de terem envolvido o que era agora o fascínio das crianças daquela numerosa e abastada família.
Já passava da meia-noite e a Gracinda antes de regressar a casa ainda foi dar de comer ao gado, acariciar uma das cabras que estava prestes a ter cria e espalhar algum feno pelo chão do estábulo para o tornar ainda mais confortável para os animais, tendo tempo ainda de passar pela casa da vizinha Cordoeira, certificando-se se o lume da lareira estava apagado, aconchegar-lhe os cobertores ao corpo e fazer-lhe um pouco da companhia que à muito se viu privada desde que o marido, operário da construção civil, falecera de forma trágica num acidente de trabalho num dos bairros de Paris.
Sozinha com a mãe, no meio de quatro paredes iluminadas por uma candeia de azeite que projectava as suas sombras na rudez das pedras de granito, Gracinda olhava inerte para a lareira e para o caldeiro de onde fumegava o mesmo odor que há muito lhe dava o sustento.
Enquanto a mãe Florinda[2] ainda esbracejava num alguidar para amassar o resto da massa dos cuscurões, Gracinda, de olhos abrilhantados pelo lume da lareira, lembrava a enorme árvore de natal da casa do médico que não lhe cabia dentro do casebre, imaginando-se criança e a brincar com os brinquedos que não vira mas que idealizava bonitos, a avaliar pela beleza dos papeis de embrulho que agora jaziam amarrotados num dos caixote do lixo.
Atenta que estava aos sons que viessem do outro lado das paredes da casa, ao menor sinal que lhe soou Gracinda correu apressada para o estábulo onde se iniciara o parto de mais um caprino, ajudando ao seu nascimento, aligeirando as dificuldades da velha cabra que soltava bramidos de dor.
Exausta, e depois de ter avisado a mãe que iria ficar no estábulo nessa noite para vigiar o animal que acabara de nascer, Gracinda, sentindo-se frágil mas inundada de felicidade, enroscou-se numa velha manta e aconchegou-se junto do pequeno cabrito de quem grande parte da noite não desviou o olhar, acariciando-o com a mesma ternura como se fora um brinquedo que nunca recebera, acabando por adormecer enquanto recordava todos momentos em que nunca tivera tempo para brincar.
No dia seguinte e de regresso ao trabalho do campo na companhia da mãe, Gracinda mais uma vez acabou por verificar que afinal tudo estava tal e qual como dantes, apesar do pároco da aldeia anunciar todos os anos que o mundo iria mudar “com o nascimento do menino”.

                                                                                 
Carlos Vardasca
21 de Dezembro de 2011

In: “Tempos Inquietos 2”, páginas 63, 64. 21 de Dezembro de 2008.


[1] Gracinda da Conceição Correia Braz Vardasca (minha mãe).
[2] Florinda Correia (minha avó materna)

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Um tesouro perdido em Cacilhas (Artigo do jornal "A BOLA" de 30 de Outubro de 2011)


Durante o século XIX, a fragata D. Fernando II e Glória percorreu as águas dos oceanos Atlântico e Índico. Foi a última nau portuguesa da carreira da Índia e o derradeiro vestígio do império português naquele país. Hoje, dois séculos depois, é um museu e descansa em Cacilhas. Milhares de pessoas passam ali todos os dias. Mas poucos reparam nela.
Para assinalar o 196.º aniversário do nascimento do rei D. Fernando II, a Marinha Portuguesa abriu ontem as portas da embarcação. O alemão Fernando de Sax Coburgo tornou-se rei de Portugal a partir de 1836 quando casou com a rainha D. Maria II, cujo nome próprio era Maria da Glória. Construída em 1843, em Damão, na Índia, a fragata – nome dado a um navio com capacidade de guerra - foi baptizada em homenagem ao casal real.
«Durante 33 anos, o navio fez a ligação entre Portugal e a Índia, além de comissões em Angola e Moçambique. Cada viagem à Índia durava quatro meses», explica Rocha e Abreu, capitão de mar-e-guerra e comandante da D. Fernando II e Glória desde 2007. A nau (só navegava à vela) percorreu mais de cem mil milhas náuticas, o equivalente a cinco voltas ao Mundo.

Da destruição à restauração
Em 1889, passou a servir como Escola de Artilharia Naval e cumpriu um papel de ensino até 1963. Até que ficou quase destruída.
«Uma soldadura mal feita provocou um incêndio enorme. O navio ardeu e ficou encalhado no rio Tejo até 1992», conta Rocha e Abreu.
O Arsenal do Alfeite e os estaleiros Rio-Marine de Aveiro demoraram cinco anos a reconstruir a embarcação. Custou 12 milhões de euros e a D. Fernando II e Glória regressou aos mares como museu na Expo 98. Foi restaurada tal como foi construída, apenas com velas e sem motor auxiliar. Só navega a reboque.
«Colocar-lhe um motor auxiliar seria desvirtuar o navio. Até seria possível navegar só com as velas, mas era preciso uma guarnição de 150 homens», explica o comandante.
A partir de 2008, a D. Fernando II e Glória passou a estar em Cacilhas, junto ao terminal fluvial. Milhares de pessoas passam ali todos os dias rumo a Lisboa, mas poucas reparam numa embarcação de 86 metros de fora a fora. O último vestígio do império português na Índia.
«Seria impossível ter este navio a ocupar uma doca seca em Lisboa durante tanto tempo. Estas docas estavam inutilizadas e a Marinha assinou um protocolo com a Câmara Municipal de Almada. A autarquia está satisfeita em ter este pólo cultural no concelho», salienta Rocha e Abreu. O comandante recusa a ideia da pouca visibilidade da fragata em Cacilhas.
«A maioria das pessoas repara no navio e, ao fim de algum tempo, a curiosidade leva-as a visitar a D. Fernando II e Glória. E os restaurantes da zona beneficiam com isso», sublinha Rocha e Abreu.

Um sábado diferente
Com as portas abertas – a visita custa três euros – o museu recebeu dezenas de visitantes este sábado de manhã. Além de comandante, Rocha e Abreu é relações públicas, guia e historiador do navio.
Ontem, liderou as visitas guiadas pelo convés e bateria da fragata. Ao todo, a fragata tem 44 canhões, 22 em cima e outros tantos em baixo. Cada canhão pesa 1700 quilos e eram precisos oito homens para cada um. A D. Fernando II e Glória pesa 1849 toneladas. Só para fazer a suspensão da âncora eram precisos 82 homens...
Rocha e Abreu mostrou tudo. Os aposentos do comandante, a messe dos oficiais, o paiol da pólvora, a ‘burra’ - nome dado ao cofre do comandante onde era guardado todo o dinheiro -, a enfermaria e a roda do leme, feita de teca, uma madeira utilizada na Índia. Para manobrar a roda do leme eram precisos quatro homens. Para colorir o navio, foram colocados alguns manequins de cera, com roupas iguais às do século XIX.
«Às vezes estou no meu gabinete e os visitantes confundem-me com os bonecos de cera. Quando me mexo assustam-se. Até já faço de propósito», sorri o comandante da D. Fernando II e Glória.

Por Rui Miguel Melo
Foto de Luís Neves/ASF
Jornal “A BOLA”
30 de Outubro de 2011

domingo, 20 de novembro de 2011

"Três dedos de conversa à volta do ensopado de borrego"



Conforme o combinado, lá nos encontrámos na Associação de Fuzileiros do Barreiro, para mais uns momentos de convívio e de confraternização.
Vieram de Lisboa o Augusto (Torta), Joaquim (Anão), Joel (15) e o João Coelho (295, que anda embarcado no navio “Noruega”), tendo-se encontrado na Estação Sul Sudoeste (junto ao Terreiro do Paço) onde apanharam o barco rumo ao Barreiro.
Da margem esquerda do Tejo deram à costa o Braz (14), José Alves (Gorila) e a esposa, o Artur Marques e o António Pereira que também se fez acompanhar pela sua companheira.
Como todos os encontros entre ex-Fragatas e velhos amigos, foram momentos muito saudáveis, onde o recordar de pequenos episódios da nossa vivência é sempre motivo de satisfação.
Seria interessante que estes encontros esporádicos fossem uma prática a cultivar, principalmente em localidades onde residem muito próximo uns dos outros um número razoável de ex-alunos, como é o caso do Algarve, pois seria uma óptima e excelente forma de se encontrarem com alguma regularidade.
Voltando de novo à Associação de Fuzileiros (cuja decoração se assemelha ao interior de um navio), lá fomos travando “três dedos de conversa à volta do ensopado de borrego” que estava muito saboroso, mas também de umas costeletas, pois o Joaquim parecia já vir do Bombarral enjoado do “borregum”.
Foram momentos bem passados e que se prometem repetir numa outra altura, e quando a disponibilidade de cada um o permitir.
Na próxima Sexta-feira (última do mês) lá vamos de novo à tasca do “Cid” para o nosso encontro mensal, onde cada vez mais vão aparecendo ex-alunos (que ali se juntam aos ex-funcionários da SNAB em fraterna confraternização) tendo já sido sugerido ao seu proprietário (em jeito de brincadeira) que faça obras de ampliação porque senão os clientes “mudam de poiso”.

Carlos Vardasca
(Braz, ex-aluno nº 14

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Pedido de colaboração


            Caros ex-alunos da Fragata D. Fernando II e Glória
Venho por esta forma pedir a vossa colaboração para um assunto que passo a descrever.
Fui contactado pelo Sr. Américo José Vidigal Alves, Subtenente do Serviço Técnico – Ramo de Hidrografia, a prestar serviço no navio Hidro-Oceanográfico N.R.P. D. Carlos I, e neste momento a estudar na Universidade de Lisboa no Mestrado em História Marítima na Faculdade de Letras (em parceria com a Escola Naval) onde o mesmo solicita a nossa colaboração para a sua tese de Mestrado, intitulada “Assistência, Educação e Trabalho no Estado Novo O Caso da Obra Social da Fragata D. Fernando II e Glória”.
Tendo em conta o exposto, e porque o assunto também se reveste da máxima importância para todos nós, e nos deve encher de orgulho haver alguém que dedique a sua tese de mestrado a um tema que muito particularmente nos diz respeito, apelo a que, dentro das possibilidades de cada um de nós, que colaboremos com este “Filho da Escola” na elaboração deste seu estudo, de extrema importância, não só para dignificar e dar mais visibilidade à Obra Social de que todos nós fizemos parte, mas também para a sua própria realização pessoal e profissional.
A forma de colaborarmos é simples, e resume-se apenas ao preenchimento de um pequeno questionário que já vos foi enviado, onde podemos responder de uma forma bastante acessível às variadíssimas perguntas que ali são colocadas, que são fundamentais para a realização do trabalho que aquele nosso amigo pretende apresentar.
Na eventualidade de aceitarem colaborar com este “Filho da Escola” e depois de o questionário estar devidamente preenchido, devem enviá-lo para o seguinte endereço: vidigalves@gmail.com até ao final do presente mês de Novembro, para que o mesmo possa iniciar a elaboração do seu trabalho de investigação.
Mais informo que, na eventualidade de surgirem algumas dúvidas no preenchimento do questionário, podem contactar directamente com o autor do trabalho para:
Américo José Vidigal Alves: Telefone: 309848943 ou telemóvel: 962554185, que vos prestará todos os esclarecimentos necessários.
Sem outro assunto de momento
 Um abraço para todos

Alhos Vedros, 07 de Novembro de 2011
Carlos Alberto Correia Braz Vardasca
(Braz, ex-aluno nº 14 da Fragata D. Fernando II e Glória)                         

sábado, 29 de outubro de 2011

Uma ausência no mínimo "insólita"

In: "Revista da Armada" nº 456 ano XLI. Setembro/Outubro de 2011, página 28.

Conforme notícia vinda na “Revista da Armada” (nº 456, ano XLI. Setembro/Outubro de 2011), celebrou-se a bordo da Fragata D. Fernando II e Glória no passado dia 29 de Maio uma missa de sufrágio para assinalar o terceiro ano do falecimento do Almirante António Andrade e Silva.
Devido ao prestígio granjeado por aquele Almirante pela iniciativa que liderou na reconstrução da Fragata D. Fernando II e Glória, esta cerimónia reveste-se de extrema justeza tendo em conta a sua contribuição para a preservação daquela que foi a “última nau da carreira das Índias”, onde nós ex-alunos tivemos o privilégio de fazer dela “o nosso refúgio” até ao dia do incêndio que a consumiu em 03 de Abril de 1963, tornando-nos “seus órfãos”.
Esta cerimónia, pela importância de que se revestia, penso que a ausência dos ex-alunos da Fragata D. Fernando II e Glória foi uma ausência no mínimo “insólita”, uma vez que estes estão intimamente ligados à sua história e dela não devem ser separados por uma questão de afectividade e de rigor histórico.
Para além das individualidades presentes e dos familiares do Almirante Andrade e Silva, é de reconhecer que, se os ex-alunos daquela instituição (actualmente organizados numa Associação) tivessem sido convidados para estarem presentes, decerto que a sua representação contribuiria par dar à cerimónia (para além da importância e da solenidade de que a mesma se revestiu) um maior significado um pouco mais abrangente, mais que não fosse que a sua presença fosse uma forma de agradecimento por aquele oficial ter contribuído para manter bem viva a “velha Nau” agora renascida das cinzas, o que tem contribuído para solidificar a nossa solidariedade ainda hoje presente, com a realização anual dos Encontros Nacionais dos Antigos Alunos da Fragata D. Fernando II e Glória.
Aqui fica o apelo a quem de direito. Sempre que se realizem cerimónias oficiais a bordo da Fragata D. Fernando II e Glória e que as mesmas se relacionem com a história daquela “Velha Nau”, nós ex-alunos ficar-vos-íamos imensamente agradecidos (não sendo nenhuma obrigação, claro) que se lembrassem de nós, dado que hoje e apesar da nossa “longa juventude”, ainda nos sentimos intimamente gratos por estarmos ligados à sua história, pois foi através dela que adquirimos as “ferramentas” com que construímos o nosso futuro e nos fizemos os homens que somos.
Carlos Vardasca
(Braz, ex-aluno nº 14 – 1963-1968) 

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Henrique Tenreiro, o "benemérito" do regime

A actividade pesqueira nas águas revoltas e gélidas dos mares da Terra Nova e Gronelândia era muito dura, dureza essa que não era repartida de igual modo por toda a tripulação das frotas que ali operavam, existindo, no caso dos navios portugueses, privilégios tão diferenciados que se assemelhavam (com as devidas diferenças, claro!) à vida faustosa da minoria dos membros da corte na época medieval em relação aos da maioria dos membros da plebe, condições de vida e de trabalho que foram substancialmente alteradas com a revolução burguesa do 25 de Abril de 1974.
Nos vários navios que interviam naquela “arte”, embarcaram também vários ex-alunos da Fragata D. Fernando II e Glória nas mais diversas actividades e profissões, e são eles e outros seus companheiros de campanha, que testemunham uma realidade muitas vezes desconhecida de muitos de nós, cujo relato impressiona quem da vida sempre se pautou pela igualdade de direitos, pelo respeito e dignidade do ser humano.
Devido à vida dura que levavam, mais concretamente os pescadores da frota pesqueira do bacalhau, devido ao mau tempo e às péssimas e duríssimas condições de trabalho, esta “arte” começou a ressentir-se da afluência de nova mão-de-obra, havendo necessidade por parte dos responsáveis que mais dela beneficiavam de inverter esta situação, tendo em conta os interesses que estavam envolvidos à volta deste negócio altamente rentável mas sempre mal pago.
Precisamente com essa preocupação, enquanto decorria a Segunda Grande Guerra Mundial, surgiu a Obra Social da Fragata D. Fernando II e Glória (…) que partiu de uma ideia de a utilizar como centro ou sede de uma instituição de interesse social, por parte de individualidades tais como o Capitão-de-mar-e-Guerra Nuno Frederico de Brion, do embaixador de Portugal em Londres, Doutor Pedro Teotónio Pereira e do então Capitão-Tenente Henrique dos Santos Tenreiro[1](…), ideia essa que veio precisamente por acabar de cumprir um duplo objectivo ou seja;
Por um lado, a sociedade da altura (que tinha um conceito de solidariedade muito retrógrado e mais vocacionado para a “caridadezinha”, sem contudo criar condições para alterar o modo de vida das pessoas mais necessitadas porque isso alimentava o seu ego de benemérito) lhes ficaria muito grata por a bordo daquela velha Nau se conseguir albergar (ou esconder dessa mesma sociedade) crianças carenciadas, mas, por outro, criava-se também ali uma espécie de “viveiro” de futuros pescadores, que futuramente iriam preencher a escassez de mão-de-obra com que a frota pesqueira se debatia naquela época.
Não é por acaso que nessa altura, o regime de então (com a colaboração interessada e a influência de Henrique Tenreiro e de outros armadores) faz publicar um Decreto do Lei que isenta a participação na Guerra Colonial de quem viesse a participar na pesca do bacalhau, de forma a aumentar o efectivo a bordo dos pesqueiros, apesar de quem a ele viesse aderir desconhecer a vida duríssima que iria enfrentar, geralmente jovens de famílias habituadas à vida do mar oriundos de regiões do litoral (Nazaré, Ílhavo, Póvoa do Varzim) mas também do interior, que viviam com parcos recursos e viam naquele modo de vida uma forma de melhorar a sua existência.
Com a cumplicidade das autoridades do regime que beneficiavam e dominavam todo o comércio da pesca do bacalhau (dado que alguns deles também eram proprietários de alguns desses navios) as condições de vida a bordo dos pesqueiros antes do 25 de Abril eram tão desiguais entre a tripulação, que não seria possível ao cidadão comum imaginar esta diferenciação tão desumana.
Enquanto que ao Comandante de bordo e restantes oficiais (incluindo especialidades ligadas às máquinas e outras) as refeições diárias eram compostas por sopa, prato de peixe, prato de carne e fruta, aos pescadores era servido ao almoço e jantar apenas sopa e um único prato (geralmente peixe) tendo direito numa das refeições a um prato de carne apenas às Quintas-feiras e Domingos, composto por chispe com feijão ou carne salgada conservada em barricas de madeira.
Aos camarotes dos primeiros (que exibiam alguma comodidade apesar da exiguidade do espaço) eram fornecidos pela Companhia Armadora os colchões, enquanto que aos pescadores era-lhes exigido que o trouxessem de casa, se quisessem ter as comodidades no fundo dos porões onde dormiam amontoados, convivendo de braço dado com a insalubridade.
Na hora da faina e do puxar as redes para bordo, com a ondulação forte, com temperaturas que rondavam os 15 e 25 graus negativos, com ventos frios a flagelar o navio e a soprar-lhes na face por vezes gretada, protegida por uma barba espessa coberta de gelo e o corpo protegido por fatos de oleado que também tinham que trazer de casa, era impressionante ver como esta tarefa era feita de forma tão rudimentar pelos pescadores (por vezes sob o efeito do bagaço simples que lhes era distribuído sob o pretexto de aquecerem o corpo) e sem o mínimo de condições de trabalho e de segurança.
Por lhes serem fornecidas luvas de lã que se desfaziam em pouco tempo devido à agressividade do tempo e à dureza da faina de puxar as redes para bordo, com as mãos geladas do frio que lhes congelava os movimentos, muitos pescadores eram obrigados a improvisar luvas um pouco rudimentares de pedaços de couro que faziam parte do aparelho de pesca, protegendo-se desta forma das farpas dos cabos de aço que sobressaiam daquele aparelho, que muitas das vezes lhes provocavam ferimentos profundos nas mãos impossibilitando-os de participar na faina seguinte, isto tudo a troco de um salário mísero que não era proporcional à extrema dureza do trabalho que efectuavam.
É claro que a tudo isto não foi alheio o regime do Estado Novo nem todos aqueles “que se alimentavam da mesma gamela” (onde se inclui o Almirante Henrique Tenreiro e outros que também enriqueceram com a epopeia das pescas) e que viveram sempre à sombra dos privilégios que o regime lhes concedia, mas que ao mesmo tempo ostentavam uma pose de beneméritos, quando no fundo se aproveitaram da extrema pobreza e das necessidades dos mais carenciados para fazerem deles os “eternamente agradecidos” enquanto eles se auto intitulavam os “historicamente benfeitores”.
Por muito que alguém (involuntariamente) se possa sentir agradecido pelos benefícios que possivelmente retirou da situação vivida antes do 25 de Abril e da convivência que lhe foi proporcionada por ter privado com algumas das personagens do Estado Novo, eu considero que a história deve ser uma descrição isenta dos acontecimentos vividos e sem qualquer adulteração dos mesmos.
Por conseguinte considero, por uma questão de honestidade intelectual e de rigor histórico, que os factos não devem ser alterados ou, por esta via, se tente reabilitar a imagem de quem quer que seja, porque isso seria adulterar uma realidade inquestionável e universalmente comprovada pelos acontecimentos, que não pode ser escamoteada por meros sentimentos saudosistas.
Não sendo o único (como por vezes se quer fazer querer) o Almirante Henrique Tenreiro pode ter sido (motivado pelas intenções economicistas da altura e já descritas) um dos obreiros da Obra Social da Fragata D. Fernando II e Glória e, através desta instituição, as crianças que lá foram internadas terem sido beneficiadas por lhes ter sido proporcionado a utilização das “ferramentas” com que construíram o seu futuro.
Mas isto não quer dizer que (por esse facto) se “apague a história”, isentando aquele Almirante e outras personalidades das suas responsabilidades e do colaboracionismo com o regime repressivo do Estado Novo, assim como da sua cumplicidade com as condições impostas e tremendamente degradantes em que viveram milhares de pescadores e outros profissionais que participaram na pesca do bacalhau, que perderam a sua juventude navegando meses a fio longe dos seus familiares nos mares tumultuosos e frios da Noruega, Terra Nova e da Gronelândia, onde, suportando condições de trabalho e de sobrevivência duríssimas debaixo de tempestades medonhas, com a morte diariamente a “inundar-lhes o convés ou a espreitar pelas vigias”, amargamente aí procuraram melhores condições de vida e o sustento dos seus familiares.

 Carlos Vardasca
(Braz, ex-aluno nº 14 – 1963-1968)
21 de Outubro de 2011

Foto: Pescadores portugueses da Pesca do Bacalhau.



[1] In “D. Fernando II e Glória. A Fragata que renasceu das cinzas”, página 159, de António Emílio Ferraz Sacchetti. Edição dos CTT, Correios de Portugal 1998.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Sobre a Obra Social da Fragata D. Fernando II e Glória

Após a publicação no “Cesto da Gávea” das providências desenvolvidas pelo Sr. Almirante Andrade e Silva, quanto à reconstrução da Fragata D. Fernando II e Glória, através do apelo aos mecenas, a fim de angariar verbas que viabilizassem a reconstrução da velha Nau da última viagem à Índia Portuguesa, venho também relembrar o seguinte.
Esta velha Nau foi vítima de um trágico incêndio no dia 3 de Abril de 1963, deixando-a quase totalmente destruída.
À data do incêndio, funcionava na referida Nau a Obra Social da Fragata D. Fernando. Assim, ficou durante 25 anos (1963 a 1998) colocada no “Mar da Palha” sofrendo as agruras do tempo, que teimava passar, sem qualquer conservação e manutenção.
Como ex-aluno da Fragata D. Fernando II e Glória, e informado como a Obra nasceu; do financiamento necessário e realizado para o exercício da mesma (que na altura albergava aproximadamente 150 alunos, tendo o número diminuído já nas instalações em Setúbal dado o exíguo espaço nas instalações da Capitania do Porto de Setúbal) compete-me esclarecer o seguinte:
Desta forma, sinto-me no dever de transmitir esta informação aos ex-alunos da Fragata, que esta Obra Social, criada no ano de 1940, e instalada na referida Nau, foi um projecto desenvolvido e executado pelo Sr. Almirante Henrique Tenreiro e instituições dele dependentes.
Assim se faça jus a esta informação, que só a mim cabe a responsabilidade da mesma, dada a politização feita em torno deste Oficial da Armada Portuguesa.

Texto enviado por
Joel Costa Inácio*
Ex-aluno nº 15 (1963-1964)

*Ex- aluno da Fragata D. Fernando II e Glória/Obra Social da Fragata D. Fernando, que privou com o Sr. Almirante Henrique Tenreiro de 1965 a 1974 e ex-funcionário do Grémio dos Armadores de Navios da Pesca do Bacalhau.
Foto: Contra-Almirante Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Um exemplo de vida


Manuel João Carvalho Barrocas, foi um antigo aluno da Fragata D. Fernando II e Glória com o número 159, tendo entrado para aquela instituição no ano de 1955 e saído em 1957, onde ingressou na Marinha Mercante e embarcado nos navios portugueses “Timor”,“Funchal” e “Angra do Heroísmo”, mas também no navio francês “Charles Tellier” que transportava emigrantes portugueses para o Brasil, e nos navios ingleses “Aragon” e “Fairskay”, este último onde deu a volta ao mundo transportando emigrantes ingleses para a Austrália e Nova Zelândia.
Mais tarde, para além de outras funções que desempenhou ao logo da sua vida de trabalho, veio a desempenhar as funções de desenhador industrial na Sorefame.
Da sua alcunha “O Pachachinha”, apenas se lembra que o passaram a chamar assim porque quando entrou para a Fragata a farda que lhe deram já tinha inscrito aquele adjectivo no peito, possivelmente de um antigo aluno a quem lhe atribuíram aquela alcunha, e que o Barrocas veio a “herdar” sem nunca saber de quem se tratava.
Apesar de a sua juventude contar hoje com os seus setenta anos de idade e de por vezes andar de “braço dado” com alguns problemas de saúde, o Barrocas continua a manter uma actividade bastante intensa mas deveras dignificante, tendo em conta as várias áreas em que intervêm, dando um pouco de si em prol dos outros sem nada pedir em troca.
Como ele costuma dizer; “A vida tem de ter solidariedade senão não tem sentido”, ao mesmo que tempo que se lamenta dizendo:
Por aqui nestas aldeias do interior tudo vai mal. As pessoas continuam com os mesmos problemas que ninguém resolve. As pessoas continuam a ter que ir ao médico às cinco da manhã, atravessando pinhais e caminhar cerca de cinco quilómetros Continuando:
O desemprego está a atirar muita gente para a porta dos cafés e já começa a haver assaltos nas vilas aqui próximas.
Com base num longo texto que me enviou, onde descreve o seu percurso de vida, e que se torna impossível aqui reproduzir, ficando-se apenas com um pequeno resumo do mesmo, e tendo como pano de fundo esta sua preocupação que é constante, o Barrocas, segundo a sua experiência de vida, lá vai abdicando do seu próprio tempo para se dedicar aos outros, pois de outra forma a sua vida não teria sentido.
Desde o trabalho voluntário que presta (na companhia da sua esposa) aos idosos sem família na aldeia de Serrazes onde habita, prestando-lhes apoio social, minimizando as suas dificuldades de mobilidade; à Associação de Solidariedade Social de Santa Cruz da Trapa (ARCA) de que fez parte da sua direcção, onde participava na distribuição de bens alimentares e de roupas aos mais necessitados.
Ao gosto que tem em preservar as tradições e os costumes com a colecção de peças de artesanato que fazem parte do passado rural; pela sua preocupação pela preservação da memória colectiva, ora como correspondente dos jornais “Gazeta da Beira” (São Pedro do Sul) e do “Notícias de Lafões”, com a elaboração de artigos de opinião editados na imprensa local, passando pela actividade cultural e musical que exerce, tocando viola num Grupo de idosos de Santa Cruz e no Rancho Folclórico da sua terra.
Existem vários exemplos no nosso país de pessoas que do seu trabalho voluntário tentam minimizar o sofrimento dos outros mas, neste caso particular, o nosso companheiro Barrocas merece da nossa parte toda a admiração, não só por ter sido ex-aluno da Fragata D. Fernando II e Glória do qual muito se orgulha, mas principalmente por ter dedicado parte da sua vida ao apoio dos mais necessitados, apoio esse que vai mantendo apesar da sua jovem idade.
É de facto de louvar quem do seu tempo ainda lhes sobra outro tanto em favor dos outros e, por esse facto, em nome de todos nós, aqui fica esta singela e justa homenagem a este nosso companheiro (e a todos aqueles que se dedicam a estas causas nobres) que vai mantendo bem alto, com a lucidez humanista que o caracteriza, os valores da solidariedade social.
É de facto um exemplo de vida, e é com bastante satisfação e orgulho que registamos aqui a dedicação de um ex-aluno da Fragata D. Fernando II e Glória em prol dos que mais necessitam.
Bem-haja amigo Barrocas. Ainda bem que ainda existem pessoas assim.

Carlos Vardasca
(Braz, Ex-Aluno nº 14)
19 de Outubro de 2011
Foto 1: O Manuel João Carvalho Barrocas (de panamá branco) a bordo da Fragata D. Fernando II e Glória, no dia 02 de Abril de 2010, a quando da realização do IV Encontro Nacional dos Antigos Alunos daquela instituição. Em destaque, uma foto sua quando era aluno.

Foto 2: Aspecto de uma parede da sua casa, onde se denota a preocupação do Barrocas na reclha e preservação de utensílios relacionados com a actividade rural e outros ofícios.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Um pouco de história sobre a Fragata D. Fernando II e Glória (1)

(…) No dia 13 de Junho de 1832 foi lançada à carreira, nos estaleiros de Damão, a Fragata D. Fernando II e Glória. Realizou a sua última viagem em 1878. A época da Fragata D. Fernando II e Glória foi uma época de plenos acontecimentos e de alterações políticas importantes, quer de âmbito nacional, quer internacional (…)
(…) As lutas liberais, iniciadas em 1826, pouco antes da construção do navio e que se prolongaram até à assinatura do Acto Adicional (5 de Julho de 1852). Um mês depois a Fragata D. Fernando II e Glória iniciou a sua actividade operacional, a partir de Lisboa (…) Página 23
(…) Mas a instabilidade política em Portugal continuava e a construção da fragata em Damão arrastava-se, em consequência dessa perturbação política e das dificuldades financeiras que daí resultavam (…) Página 29
(…) Em 1843, quando o governador da Índia, Francisco Xavier da Silva Pereira, 1º Conde da Antas, se preparava para entregar o cargo e regressar a Lisboa, deixou tudo encaminhado para que se pudesse rapidamente concluir a construção da Fragata D. Fernando II e Glória. Assim se fez. A Fragata D. Fernando II e Glória foi lançada à água em 22 de Outubro de 1843, seguiu para Goa onde aparelhou e armou, e de onde largou em 2 de Fevereiro de 1845, chegando a Lisboa em 4 de Julho (…) Página 33
(…) Logo no mês seguinte, em 26 de Agosto, a Fragata D. Fernando II e Glória navegou para a ilha da Madeira como navio-chefe de uma pequena frota naval que tinha a honrosa missão de conduzir a princesa Maria Amélia que, acompanhada por sua mãe, a imperatriz do Brasil e Duquesa de Bragança, naquela ilha ia procurar e tratamento para a sua debilitada saúde. Foi assim que a fragata iniciou a sua vida de unidade operacional da Armada (…) Página 34.
In: “D. Fernando II e Glória. A Fragata que renasceu das cinzas”. De António Emílio Ferraz Sacchetti. Edição dos CTT de Portugal, 1998.
Foto: Batalha do Cabo de S. Vicente entre Absolutistas e Liberais, em 5 de Julho de 1833.
Última batalha do século, travada um ano depois de a Fragata D. Fernando II e Glória ter sido lançada à carreira. Quadro de Morel, 1842.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

"David Melgueiro"

Visita efectuada a bordo do "David Melgueiro" em 1951, pelo então presidente da República General Craveiro Lopes, ministro da marinha Almirante Américo Tomáz, presidente da CRCB Engenheiro Higino Queiroz e pelo delegado do governo junto do GANPB Comandante Henrique Tenreiro.

Foto da tripulação do "David Melgueiro" que estava prestes a iniciar a sua primeira viagem, na companhia daqueles membros do Estado Novo. Cais de Alcântara, 1951
A SNAB teve a feliz ideia de homenagear os nautas de antanho ao incrustar no costado dos navios que mandou construir os nomes de Álvaro Martins Homem, João Corte Real, Pedro de Barcelos, João Álvares Fagundes, Estêvão Gomes, Fernandes Lavrador e, por último, David Melgueiro.
O livro de Duarte Leite “História dos Descobrimentos” descreve o fantástico itinerário do navegador David Melgueiro a bordo do veleiro holandês “Padre Eterno”, em 1660, com partida do Japão e passagem ao longo da Tartária, Spitzberg, Gronelândia, Escócia, Irlanda, Holanda e Portugal. Os dois volumes de Duarte Leite foram publicados em 1959 e 1962 por Edições Cosmos.
O arrastão “DAVID MELGUEIRO” foi construído nos Estaleiros T. Van Duijvedijk Scheepswerf, Holanda, e tinha as seguintes características:
Comprimento de fora a fora: 80,14 metros, tonelagem de arqueação bruta: 1.692,70: toneladas Motor principal 1.600 BHP: capacidade para carregar 30.000 quintais de bacalhau salgado verde (1800 toneladas).
O arrastão seria o maior do mundo ate então construído. Foi lançado à água em 1950 e iniciou a actividade em 1951. No ano de 1976 foi parcialmente convertido em navio congelador e, em 1979, projectou-se a transformação em totalmente congelador.
O seu primeiro Capitão foi o jovem Emílio Carlos de Sousa, que já havia dado provas do seu talento de marinheiro e pescador em navios de arrasto da pesca do alto. Saiu da SNAB para o comando de frota de arrasto, na União Sul Africana. Regressou a Lisboa para comandar nau “BARTOLOMEU DIAS” de Lisboa a Cape Town.
As fotografias evocam a visita ao “DAVID MELGUEIROI” do Presidente da República General Craveiro Lopes, Ministro da Marinha Almirante Tomás, Presidente da CRCB Eng.º Higino Queiroz, Delegado do Governo junto do GANPB Comandante Henrique Tenreiro, personalidades do Estado Novo vigente na época.
A SNAB foi representada pelos administradores Vasco de Albuquerque d’Orey e Dr. António Duarte Silva.
Armando Reis Leitão*
5 de Outubro de 2011
*Antigo Funcionário Administrativo da Sociedade Nacional de Armadores do Bacalhau (SNAB) e Administrador da empresa após o 25 de Abril

domingo, 25 de setembro de 2011

Encontro dos ex-Fragatas Joel e Augusto, ao fim de 47 anos.


Amigo Augusto,
Em 47 anos muita coisa passou pelas nossas vidas. Quando vamos em busca do encontro, mesmo depois de se ter falado durante um lapso de tempo(!?) sim que são três horas após decorridos 47 anos levamos na mente uma grande expectativa e pensamos para connosco como estará este meu amigo de aspecto. Chegado ao ponto de encontro o nervosismo aumenta mas não posso demonstrar. Abraçamo-nos Hei... pá! Estás porreiro? Estamos mais velhos. Pois é. Fiquei mais gordo, não tanto, mas tu continuas mais alto. Enfim! são um conjunto de observações ditas de maneira frontal e vividas com bastante intensidade, pois que voltamos à nossa meninice. O tempo começa a passar e já em casa do Augusto surge outro conjunto de emoções tudo para se querer mostrar num ápice; casa,  filhos, netos,  esposa e fotos... olha estás a ver tenho aqui a Fragata e olha também tenho o David Melgueiro. Hei, pá foi neste barco que organizei a minha vida. Deu para ganhar uns dinheiros e percorrer a minha carreira até ao topo. Sabes teve de haver muita organização e vontade de aprender... sabes isso não me faltava, esta conversa já "no porão ó melhor dizendo na casa das máquinas".  Nesta cave da casa onde estão guardados muitos anos de labuta e por força do ofício mais não parece efectivamente do que uma "casa das máquinas" mas já com um certo requinte muito fresca, sofás, máquina de café garrafeira e utensílios de origem que servem de recordação ao desempenhos da função, até oficina para moldar peças há. É uma vida inteira de trabalho que serve o descanso do "Lobo-do-mar" que ajudou a seu navio a navegar muitos milhas. Agora reformado sentam-se dois homens a entrar na pré velhice a lembrarem-se dos seu tempos da Fragata.  É tentar dizer em curto espaço de tempo aquilo que levou 47 anos a passar. Umas conversas bem estruturadas e outras nem por isso dado a ânsia de tudo se querer contar em tão pouco tempo.
Fiquei estarrecido com o que vi com o Augusto em terra, e sua casa na cave tem um local semelhante à "casa das máquinas". Compreendo muito bem a necessidade de um local semelhante onde passou toda uma vida. Só que agora a sua "casa das máquinas" está bem fixada em terra, que certamente serve de recordação dos tempos idos.
Augusto. Esta minha narrativa transmite fielmente o que vi e senti, porque o local magnifico assim o transmite. Estou muito orgulhoso por ti e uma certa ponta de "inveja" de não ter o meu escritório à semelhança da tua "casa das máquinas". Parabéns Augusto!
Estou empolgado em encontrar mais ex-alunos: Já vi o Braz e agora o Augusto, e ainda a "procissão está dentro da igreja".
Este meu rascunho não passa de um brotar de sentimentos vividos esta tarde, sem tão pouco ter sido corrigido e composto. Foi um lançar de emoções para o "papel" que necessita de ser corrigido e composto, mas não o faço! Fica mesmo assim, à semelhança de uma aguarela em que o pincel corre a tela sem pensar na técnica mas sim no pensamento e a emoção de quem o pinta.
Esta transcrição não passa de um  pensamento transcrito para o "papel".
Claro que dei com o caminho, claro! Pois para cá tudo me pareceu mais fácil.
Obrigado Augusto, pelo prazer que me deste em estar contigo esta tarde.
Este texto levou o corrector ortográfico, nem tão pouco a correcção da sua composição. É um risco que corro, mas um risco deliberado de forma a dar expressão ao meu sentimento.
Um forte abraço do Amigo,
Joel Inácio
Ex-aluno nº 15