sexta-feira, 3 de abril de 2015

Faz hoje 52 anos que ardeu a FRAGATA D. FERNANDO II E GLÓRIA (3 de Abril de 1963)



...ERA DE FACTO UMA BELÍSSIMA NAU
Todos nós, ao longo da nossa infância, fomos criando em nosso redor uma imagem à semelhança dos nossos heróis, mesmo que em batalhas nunca dantes travadas. Quantas vezes, à saída dos cinemas, inflamados com a destreza do "rapaz" do filme, nos revíamos naquela personagem, e nos sentíamos tão capazes de aplicar aquela ficção que não se encaixava numa realidade que momentaneamente fingíamos desconhecer. 
Quando fui para a Fragata D. Fernando II e Glória tinha apenas 13 anos, e vivi um desses momentos, ao ficar tão fascinado com a beleza daquela nau, "última das Índias". 

Era uma criança que se imaginava num barco de piratas, pronto a travar outras tantas batalhas contra a pobreza que me fizera seu tripulante. 
Desde os canhões alinhados como se ainda espreitassem o inimigo, aos bacamartes e armas de todo o tipo que enfeitavam o seu interior, tudo me recordava a façanha dos corsários que sempre tentei imitar. Não fosse o seu comandante (Sr. Campos, Capitão de Mar e Guerra) interromper aquele sonho que se previa prolongar naquele primeiro dia a bordo, "até que o meu imaginário se dispersasse não sei por quantas ilhas à procura de um tesouro que não existia":
― Então rapaz! Estás a gostar do teu primeiro dia a bordo? 
Como muito envergonhado que era, em vez de lhe responder, comecei a chorar. 
De imediato, senti-me envolvido por uns braços fortes que, pelo carinho e afecto que transmitiram, me fizeram esquecer a ausência do aconchego familiar, "como se a fita do filme se tivesse partido e a realidade recomeçasse nalgumas cenas mais à frente".
Foi assim desta forma que vivi o primeiro dia a bordo daquela velha Nau, feita Navio Escola para meninos deserdados de afectos, "mas feitos homens iguais a tantos outros, que mais tarde souberam moldar a vida com as ferramentas ali ensinadas".
Era de facto muito bela, e por isso ainda hoje me sinto órfão daquela nau.


Carlos Vardasca
Artigo escrito em 18 de Setembro de 2007

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